Memorial Vale da Saudade

A Inteligência Artificial e o lidar com o luto

Inteligência Artificial (IA). Você sabia que seria possível utilizar a IA como instrumento nas psicoterapias que buscam intervir em processos de luto? A IA coloca a possibilidade de “conversarmos” com nossos mortos queridos, mas isso seria eticamente correto? Não poderia trazer maiores riscos de sofrimento psicológico? Ou então novas formas de alienação da realidade?

Venha refletir com a gente.

Um projeto do Memorial Vale da Saudade, apresentado por Erasmo Ruiz

Introdução

Hoje ao navegarmos, ao entrarmos em nossas redes sociais a gente se depara com uma expressão que está sendo dita o tempo todo mostrando algumas potencialidades novas que antes estavam restritas aos romances de ficção científica. Eu estou me referindo a questão da Inteligência Artificial que promete produzir transformações profundas na maneira como nós trabalhamos e também na forma como nos relacionamos. Com possibilidades de aplicação
em vários espaços da vida humana. E claro, a gente não poderia esquecer das possibilidades que a inteligência artificial reserva ou reservaria para ser utilizada em problemáticas relacionadas à morte e mais especificamente nas intervenções sobre os processos de luto.

Pessoalmente eu não acredito que a gente deva desperdiçar ou desprezar as possibilidades que a inteligência artificial coloca nesse campo mas temos que estar atentos a determinados problemas. Os psicólogos entendem que em qualquer processo psicoterapêutico a empatia é fundamental para que esse processo possa ser bem conduzido. O que nos coloca de saída, um problema quando se pensa na inteligência artificial utilizada para esses processos.

Empatia vs programação

Será que de fato a empatia seria genuína quando o cliente estivesse se relacionando com uma inteligência artificial?

A empatia humana é muito mais complexa e profunda envolvendo capacidade de se conectar emocionalmente com outra pessoa. Compreender suas experiências individuais e oferecer suporte de forma genuína e adequada. Bom, quando a gente lida com o luto, as pessoas não estão apenas procurando respostas ou conselhos pré-programados mas também uma conexão humana que de fato seja autêntica. O que inclui por exemplo a possibilidade do terapeuta já ter passado pelos seus próprios processos de luto. A experiência do luto sempre vai ser única para cada pessoa
e muitas vezes vai requerer uma abordagem muito individualizada para atender as necessidades específicas do enlutado. O que pode ser útil para uma pessoa pode ser completamente inadequado pra outra.

A inteligência artificial por mais sofisticada que ela seja, não pode replicar a complexidade e a profundidade envolvidas no processo de empatia entre dois seres humanos. Dessa maneira podemos ver um outro problema que se instaura que é a problemática de ordem ética.

Consolo momentâneo

Será que a tecnologia não poderia criar uma falsa sensação de conforto fazendo com que os enlutados possam experimentar uma sensação momentânea de consolo mas no entanto isso podendo mascarar a necessidade fundamental de conexão humana e de apoio emocional real?

Eu me explico, uma das possibilidades da inteligência artificial, por exemplo, é criar avatares que representam a pessoa que faleceu. De que forma, de que maneira esses dados seriam constituídos pra configurar esses avatares?Será de fato que a reação emocional que as pessoas terão diante da possibilidade de “conversar” com alguém que já morreu, será que essas reações de fato serão genuínas e com desdobramentos psicoterapêuticos? ou elas produzirão alguma coisa que agudizaria os problemas? Assim, buscar conforto a partir de diálogos com inteligências artificiais poderia, por exemplo, produzir o afastamento do enlutado de pessoas amigas, familiares, de colegas de profissão e por fim fazer com que a pessoa criasse uma espécie de dependência cognitiva onde bastaria para ela produzir um relacionamento interpessoal de maneira completamente artificial e antinatural.

Os especialistas alertam portanto que qualquer desdobramento que implique no uso intensivo de inteligências artificiais podem configurar novas formas de vínculo que poderiam ser tóxicas as pessoas. Isso sem contar outras questões éticas importantes, por exemplo:

Será que esses avatares não poderiam gerar a ilusão de que a pessoa falecida ainda de fato está presente? Criando assim uma sensação de negação da realidade e portanto dificultando o processo de aceitação e mesmo superação das perdas?

Essa é uma questão importante, por quê? Conquistar o processo de elaboração significa entre outras instâncias fazer com que a vida se torne funcional novamente.

Plano funerário Memorial Vale da Saudade
A Inteligência Artificial e o lidar com o luto 1

Negação da realidade

Para isso é importante que as pessoas possam aceitar o mais plenamente possível que de fato a morte aconteceu, dessa maneira as pessoas poderiam ficar afastadas daquilo que a gente chamaria de processo natural do luto. Onde pudessem recobrar o cotidiano de suas vidas embasadas naquilo que de fato acontece na realidade e não ficarem presos a existência artificial de um indivíduo que na verdade não está mais presente conosco. Senti a necessidade de fazer esses alertas entretanto nós não podemos nos fechar as mudanças que estão sendo produzidas no nosso cotidiano.

A inteligência artificial apresenta novas possibilidades mas elas não estão restritas apenas a produzir imagens engraçadas na internet ou até aprimorar possibilidades de estudo. Na verdade a inteligência artificial pode criar uma situação onde cada ser humano se sinta completamente a parte isolado daquilo que historicamente ele sempre fez que foi aprender a produzir o conhecimento. O que faço aqui não é um convite que vocês destruam os computadores mas sim reflitam no caso das inteligências artificiais usadas no campo da psicologia, fundamentalmente esse processo tem que ser muito bem pensado, muito bem refletido para que ele possa efetivamente causar mais benefícios do que malefícios adaptando-se portanto as necessidades de cada indivíduo mas sempre tendo a clareza
de que a inteligência artificial que conversa com outro ser humano representando uma mãe que morreu, um irmão querido que já se foi continua sendo uma inteligência artificial.

Assista a Live em que nossos profisisonais, Erasmo Ruiz e Isadora Mattos, discutem esses aspectos em nosso Instagram.

Objetivando o acesso a todos que não podem escutar nosso podcast, extraímos o texto para melhor aproveitamento daqueles que preferem a leitura. Caso se interesse por escutar o podcast ThanatosCast, você encontrará nas plataformas Spotfy e Google Podcasts

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O que você espera de pessoa rotulada como “paciente terminal”?

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