Estava com meus alunos em mais uma visita ao Cemitério São João Batista aqui em Fortaleza.
A ideia da visita é mostrar que um cemitério vai muito além do que meramente ser um aglomerado de túmulos que demarcam lugares de sepultamento. Um cemitério “fala” mais do que podemos imaginar.
Mas naquela visita ele “falou” mais alto. Estávamos na entrada aguardando a chegada de todos quando adentra um cortejo fúnebre.
Na frente, uma mulher abraçada a um menino que não deveria ter mais que 11 anos. Na frente deles, uma garotinha de 5 anos. Atrás o caixão e o restante dos poucos amigos que lá foram dar o adeus derradeiro.
A mulher clamava perguntando aos céus o porquê de seu jovem marido, um homem tão bom, ter sido assassinado e que agora a deixava na dura tarefa de educar os filhos sozinha. Era mais uma viúva da violência de tantas que existem nas metrópoles brasileiras.
Mas a cena triste era “quebrada” por algo inusitado. O filho, a ela abraçado, chorava junto e lhe prestava algum conforto com abraços e lágrimas. Mas a menina, alheia a tudo, cantarolava uma canção infantil e adentrava ao cemitério pulando.
Foi então que percebi que na verdade, ao ver os ladrilhos em xadrez na entrada, a criança começou um jogo de amarelinha. Seu mundo infantil ainda não havia percebido que mesmo chegando ao céu no jogo, havia um risco grande de que sua vidinha adentrasse ao inferno da ausência do pai. Mas seu reino era o lúdico e ela sua rainha.
Crianças de 5 anos ainda não possuem uma compreensão da morte enquanto um processo irreversível, pelo contrário, sua relação com ela é mágica e, portanto, a morte é vista como algo plenamente controlável pela ação do pensamento.
Seu irmão, no entanto, já sabia da dureza da morte, de que ela deixaria para trás a enorme tarefa de transformar tanta dor e sofrimento no gosto agridoce da saudade.
Coincidentemente, na semana anterior, havíamos feito uma discussão sobre a morte no mundo infantil. E a teoria naquele momento entrou no cemitério vestida de realidade
Erasmo Ruiz
Carpen Diem
Gostei