Memorial Vale da Saudade

A saudade de quem ainda não partiu

No primeiro episódio sobre luto antecipatório, trazemos algumas informações sobre conceito, a história desse fenômeno e também reflexões sobre as perdas que podem acarretar na vivência desse tipo de luto.

Um projeto do Memorial Vale da Saudade, apresentado por Priscila Gauna

Texto do episódio

Durante este mês de Julho, vamos falar sobre o Luto Antecipatório. Você sabe o que é?

Despedidas não costumam ser fáceis. Principalmente, quando precisamos nos despedir de alguém que amamos. Mais ainda, quando temos a noção do tempo que se esvai enquanto a morte se aproxima, já não mais tão sorrateira.

Pode ser que você já tenha vivido ou esteja vivendo uma situação semelhante a essa: você, ou alguém que você ama muito, recebe o diagnóstico de uma doença grave, e o prognóstico é o mais difícil de ouvir. Falas como “incurável” ou ainda “tentamos de tudo, sinto muito”, ecoam em seus ouvidos enquanto você tenta entender se ouviu direito.

Não era pra ser assim. Não agora, não comigo, não assim.

Essa é a realidade de muitas pessoas hoje. Elas convivem diariamente com a proximidade do fim. E essa vivência não é fácil. Entrar em contato com a própria finitude e/ou com a finitude de quem se ama pode ser desafiador e doloroso.

Nós conhecemos o conceito de luto antecipatório como o luto que acontece antes da morte acontecer. Uns se enlutam pela proximidade da própria morte, outros se enlutam pelo momento da morte que se aproxima de alguém amado.

Esse fenômeno, até então sem nome, foi primeiramente observado em mulheres cujos maridos eram soldados enviados para a guerra e a partir disso, elas já se comportavam como viúvas.

É como se, ao se deparar com uma probabilidade alta de que o marido não fosse voltar para casa, essa esposa começasse a se desligar emocionalmente desse marido. Podemos pensar que era uma forma – ainda que não racional, de minimizar o sofrimento caso recebesse a notícia de que o marido havia morrido em campo de batalha.

Inclusive, muitas mulheres encontravam dificuldade em reinseri-los em suas vidas, em suas rotinas quando eles voltavam da guerra. Quem deu o nome de Luto Antecipatório para esse fenômeno foi o psiquiatra alemão Erich Lindemann, durante a Segunda Guerra Mundial.

Acredito que Elizabeth Kubler-Ross é o nome mais importante quando falamos sobre luto antecipatório. É dela o famoso estudo sobre as 5 fases do luto, onde ela traz a negação, raiva, barganha, depressão e aceitação como sendo cinco estágios que uma pessoa diagnosticada com uma doença potencialmente fatal poderá lidar em sua vivência.

Para deixar claro, ela diz que esses estágios não necessariamente acontecem nessa ordem ou ainda de forma igual para todas as pessoas que os vivenciam, portanto, assim como no luto concreto, aquele que acontece após o falecimento de uma pessoa amada, o luto antecipatório é único e completamente individual.

Seus estudos são baseados nas vivências de pessoas que, a partir dos diagnósticos recebidos, precisavam encarar suas próprias finitudes. Ela acompanhou e estudou o caso de diversos pacientes em fase final da vida, e esses estudos contribuíram grandemente para o entendimento da vivência dessas pessoas que muitas vezes ainda hoje, não são cuidadas ou compreendidas em seus lutos antecipados como deveriam e precisariam.

O luto é uma reação natural a perda de algo ou alguém significativo para a pessoa. Mas quando falamos de luto antecipatório, estamos falando de que, exatamente?

Neste caso podemos pensar no luto que advém do processo do adoecimento e também pela percepção e necessidade de lidar com questões relacionadas a finitude da vida.

Pensando aqui na situação do paciente, podemos considerar que, quando uma pessoa recebe o diagnóstico de uma doença potencialmente fatal, e durante o desenrolar dos sintomas causados pela doença, o luto antecipado pode ser vivenciado de forma muito intensa. Compartilhando alguns exemplos, posso trazer a dependência de outra pessoa para realizar atividades que antes eram simples, a perda da sensação de segurança, da autonomia e controle da própria vida, do próprio corpo, sensação de perda do respeito das pessoas ao seu redor, que muitas vezes passam a tratar a pessoa pela doença e não mais por quem ela é, a perda da autoestima por conta de entre outras coisas, as mudanças físicas que podem advir da doença, da sensação da perda da beleza, de não se sentir mais desejado ou desejada, a perda do futuro que não terá com as pessoas que ama, a preocupação com as pessoas amadas que vão ficar, a percepção da própria finitude, o medo do momento da morte e do que vai acontecer depois… Podemos pensar em diversas situações em que esse luto será vivido a partir das perdas.

A família e os cuidadores também podem e possivelmente vão vivenciar esse luto antecipado ao tomarem conhecimento de que alguém que ama recebeu um diagnóstico grave. As relações familiares podem ser transformadas, podem precisar ser reajustadas, reestruturadas a partir da ausência daquela pessoa que, em processo de morte, pode estar, por exemplo, inconsciente já há algum tempo.

Essas pessoas possivelmente precisarão enfrentar muitas dúvidas, angústias, medo e até o sentimento de culpa que podem surgir, além de ser preciso lidar com a percepção da finitude de alguém que ama, a sensação de se despedir diariamente, o medo e a ansiedade que podem surgir a partir da vivência de algo tão desconhecido e que pode ser assustador. Os planos e sonhos que existiam antes, agora ficam em suspenso no ar, como sem saber para onde ir.

A família e os cuidadores podem precisar enfrentar o esgotamento físico, mental, com a possibilidade de ter que lidar com desafios financeiros que podem acontecer.

E tudo isso pode ser extremamente cansativo, para todos.

Mas… existe outra possibilidade? Essa vivência pode ser, de alguma forma, ressignificada? Vamos conversar mais sobre isso na nosso próximo texto.

Como ter ajuda?

Se você está percebendo que precisa de ajuda, se está muito difícil, mais uma vez te digo, busque ajuda, O Memorial Vale da Saudade pensando em como ajudar na coletividade conta com programas de apoio ao enlutado mensalmente, portanto, se você ou um ente querido está vivenciando essa dor pela perda de alguém que você muito ama saiba mais sobre nossos programas clicando aqui.

Objetivando o acesso a todos que não podem escutar nosso podcast, extraímos o texto para melhor aproveitamento daqueles que preferem a leitura. Caso se interesse por escutar o podcast Vale Lutar, você encontrará nas plataformas Spotfy, YouTube Music, Deezer e Amazon Music

Conheça o Memorial Vale da Saudade e tenha toda a tranquilidade que você precisa!

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Você sabia que o luto antecipatório existe? Já viveu alguma experiência semelhante? Como foi para você?

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